Maratonista Aurélio Guedes não consegue o ouro e chora

Redação Webrun | Esporte Adaptado · 26 set, 2004

As lágrimas derramadas sobre a pista do histórico Estádio Panathinaiko, na manhã deste domingo, após a chegada da Maratona Paraolímpica de Atenas, não eram lágrimas de felicidade. Era um choro triste, muito sofrido, que o maratonista brasileiro Aurélio Guedes fez questão de externar, provocando um contraste com a imagem de felicidade da maioria dos atletas que completavam a prova.

Apesar de ser um vitorioso na vida e no esporte, com vários títulos
importantes em seu currículo, a decepção da derrota, por alguns minutos, deixou o brasileiro arrasado na pista, sob olhares perplexos de torcedores e de alguns brasileiros que tentavam consolar e motivar Aurélio.

Considerado um dos favoritos para levar o ouro na prova mais tradicional do atletismo mundial, Aurélio teve dificuldades no percurso, e chegou em décimo lugar, com o tempo de 2h51min45s. Tentando controlar o choro, a decepção do brasileiro era motivada porque a sua preparação nos últimos anos foi totalmente voltada para as Paraolimpíadas de Atenas, competição na qual ele buscava um pódio inédito para o Brasil. Tanta confiança era baseada nas últimas participações dele mesmo em competições internacionais importantes, como, por exemplo, a Maratona de Tóquio deste ano, quando
sagrou-se vencedor.

Pouco tempo depois de receber o consolo de membros da delegação brasileira, Aurélio disse as primeiras palavras, ainda com a voz embargada, para tentar explicar tamanha decepção.

“Eu tentei, me preparei muito para esse momento, mas tenho consciência que nem todo mundo ganha. A alegria é de dois ou três, talvez a tristeza seja da maioria. Tenho que entender que isso é normal. Pode ser que eu perca aqui e ganhe depois, como já aconteceu outras vezes. Vou tentar levantar a cabeça, mas é muito frustrante chegar aqui, depois de toda preparação que fiz, e não conseguir o resultado esperado”, lamentou Aurélio, admitindo que talvez
tenha errado em sua preparação ao treinar pouca nas subidas.

Os problemas de Aurélio começaram por volta do Km 10, no início da
subida, quando ele estava em segundo lugar e começou a diminuir sua passada. Ao chegar no Km 30, o brasileiro já estava distante do pelotão de frente, e ainda foi vítima de uma forte dor no baço, que o tirou da prova por dois minutos, até se recompor e continuar correndo. E foi correndo que Aurélio entrou no Panatinaiko, muito mais vazio do que na final da Maratona Olímpica, quando outro brasileiro, Vanderlei Cordeiro de Lima,apesar de prejudicado por um fanático religioso, chorou de alegria ao cruzar em terceiro.

“Vinha no meu ritmo até o décimo quilômetro, que era uma parte gostosa da prova, mas depois senti muito a subida e não consegui mais me recuperar. Tentei continuar forçando o ritmo, mas a minha condição piorou, afetada por uma forte dor no baço. Pensando melhor, agora vejo que terminar a prova também foi importante. Posso até dizer que foi uma vitória, bem diferente da que eu imaginava, mas acabei vencendo”, explicou o maratonista, que tem 41 anos e compete na classe T-12 (deficientes visuais que enxergam vultos) e
teve a companhia do atleta-guia e maratonista profissional Reginaldo Recofka Silva.

Aurélio agradeceu o apoio que a delegação brasileira, patrocinada pela Loterias da Caixa, vem recebendo da mídia. Segundo ele, os atletas paraolímpicos já mereciam uma atenção maior há muito tempo, pois o esforço para se chegar ao patamar em que eles estão é tão grande ou até maior do que o dos atletas olímpicos. Mas ressaltou que o mais importante é que esse apoio não desapareça depois dos Jogos.

Aurélio é morador de Marília, em São Paulo, e virou atleta paraolímpico em 1996. Sua deficiência é originária de um acidente de moto, sofrido aos 24 anos de idade, que o deixou com apenas 15% de sua capacidade de visão. Bem-humorado e divertido, Aurélio é um dos atletas mais queridos do meio paraolímpico. Durante as viagens, leva sempre rapadura para distribuir aos estrangeiros, principalmente as mulheres. Sob a supervisão do técnico Ciro Winckler, o maratonista treina em média cinco horas por dia.

O repórter Felipe Kozlowski viajou para Atenas convidado pelas Loterias da Caixa, patrocinadora oficial do Comitê Paraolímpico Brasileiro.

Este texto foi escrito por: Felipe Kozlowski

Redação Webrun

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