Meu primeiro contato com a corrida se deu no ginásio, nas brincadeiras entre classes na educação física. Logo que participei da primeira competição, em Joinville, o desejo de me dedicar ao atletismo se tornou cada vez maior. Sabia que teria que criar condições de mostrar aos meus pais minhas perspectivas em seguir carreira como corredora, apesar das poucas condições. Fui me decidindo, encarando como um ideal a ser conquistado passo a passo.
Nasci em Blumenau, minha família se estabeleceu em Joinville quando tinha 6 anos. Minha infância, até aos 10 anos, foi de pouca atividade. Após ter operado as amídalas, fiquei com mais saúde e energia. Fomos morar num pequeno sítio, que adorava. Tornei-me mais resistente e alegre.
Quando comecei a competir, a prova mais longa na pista era de 800m. Na São Silvestre de 1975 oficializava-se a participação feminina. Considero a minha geração de corredores de médias e longas distâncias como desbravadoras. Vivenciamos a implantação das provas mais longas, de 10km, 21km e maratona.
Minha oportunidade se deu em 1976, quase por acaso. Chegando ao treinamento de pista, vi o jornal Gazeta Esportiva na mesa do meu técnico, anunciando a eliminatória nacional da São Silvestre.
Cheia de esperança e estimulada, corri à noite os 8,9Km, cheio de subidas e descidas, Brigadeiro Luis Antonio e Consolação, tudo novidade. Para a minha felicidade, cheguei em segundo e fui considerada revelação. Em 1977 voltei e venci a eliminatória.
Em 1978 fiquei em quarto na final do dia 31 de dezembro e, então, fui convidada para fazer parte da equipe de atletismo do E. C. Pinheiros, em São Paulo. Esta mudança foi essencial para o meu amadurecimento atlético e humano.
Sempre fui determinada. Treinava duro, direcionada nos meus objetivos, buscando oportunidades. Quando deixei minha família no Sul foi difícil, mas me adaptei.
Nos momentos mais difíceis, o que importava era a minha corrida, focava meu objetivo. Se perdesse, lutaria para vencer a próxima. Na verdade, sempre encarei a corrida como um bem maior a ser cultivado em outras esferas de minha vida. Hoje sei que tive um ganho imenso mantendo esta mentalidade. Procurava estar um passo à frente para desenvolver uma dinâmica de treinos na qual a técnica, eficiência e concentração pudessem me levar a vitória e a superação.
Tive a oportunidade de treinar em Joinville. Meu primeiro técnico, natural do Japão, me orientou durante 5 anos. Acreditou no meu talento, me incutiu a disciplina e a necessidade de ter que treinar muito para melhorar. Em São Paulo, o técnico Carlos Ventura transmitiu-me o significado de competir forte em alto nível, principalmente nas provas de rua mais importantes no Brasil. Vencemos juntos.
Na equipe de Guarulhos, 1980 a 1983, o técnico Akio trabalhou a técnica e o refinamento para as provas de pista 1.500m, 3.000m e 10km. Levou-me a um patamar de treinos que foram imprescindíveis. O técnico Wanderlei de Oliveira, que orientava os corredores da Corpore, recém fundada, desenvolveu um trabalho direcionado para longas distâncias. Nossos treinos em Atibaia foram vitais para enfrentarmos as primeiras maratonas no Rio de Janeiro.
Correndo fui alcançando meus objetivos, realizando meus sonhos e muito mais. Conhecer parte do mundo, Japão, Indonésia, Austrália, EUA, América do Sul e Central. Na verdade, quando vencemos ou batemos um recorde, o momento é único, inesquecível. É quando tudo se concretiza. A corrida é um esporte individual e o atleta gera, em grande parte, suas perspectivas e, possibilidades.
Uma euforia contida e silenciosa. Foi o que senti ao vencer a Maratona Internacional do Rio de Janeiro, em 1987, ao vencer os 10km do Campeonato Brasileiro João Carlos de Oliveira, em Curitiba, ser recordista dos 3 mil no Troféu Brasil de 1981 e ser recordista de vitórias da Meia-Maratona Gazeta Esportiva. Representar o Brasil no Mundial de Maratona no Japão (Hiroshima), estar na praça onde caiu a bomba atômica, correr por entre as flores, as pequenas pontes e o verde dos jardins. Ser a melhor sul-americana na maratona de Nova Iorque em 1992 e ter representado a América do Sul num evento audacioso, patrocinado pela ONU, em 1986, denominada Corrida Mundial pela Paz e pelas crianças do mundo, enriquecendo-me humanamente com a equipe internacional de corredores e organizadores de cada continente.
Encarei esta convocação como um prêmio maior pela minha dedicação. Estive em centros de treinamento de muita estrutura, onde aprendi muito. Convivi com outras mentalidades, culturas e valores. Fiquei mais ciente da condição humana no mundo, e me realizei profundamente.
Há 15 anos como técnica do Pinheiros e à frente do Projeto Correr, dei continuidade a tudo que acredito, treinando e orientando atletas ou corredores amadores que querem, através da corrida e do treinamento sistemático, buscar novos horizontes e o aperfeiçoamento.
Eliana Reinert – Técnica E.C. Pinheiros de médias distâncias e maratona, resposável técnica do Projeto Correr/Eliana Reinert, campeã brasileira 10km Curitiba 1986 (35min39), vencedora da Maratona Internacional do Rio 87, ex-recordista e campeã do Troféu Brasil 1981/ 3.000m e melhor sul-americana na Maratona de Nova Iorque 1992.
Este texto foi escrito por: Webrun