Treinando a mente para manter o peso: como evitar o retorno à obesidade?

Elizama Modesto | Saúde · 16 abr, 2025

A mentalidade é um dos pilares mais importantes para quem deseja perder peso e, principalmente, manter os resultados a longo prazo. O verdadeiro desafio começa após o emagrecimento, quando é preciso evitar o temido efeito sanfona e consolidar os novos hábitos. Mais do que uma questão física, manter um peso saudável envolve transformações profundas na forma de pensar, sentir e agir. Não se trata apenas de dieta e exercícios — trata-se de como a pessoa se enxerga, de como lida com a comida e com as próprias emoções.

Segundo o endocrinologista Dr. Renato Zilli, “Estudos mostram que quem desenvolve uma mentalidade de crescimento — ou seja, quem acredita que pode mudar com esforço e prática — tem mais sucesso a longo prazo. Na clínica, trabalhamos muito isso: treinar o cérebro para entender que saúde é um processo contínuo, e não uma corrida de curto prazo. Para isso, é fundamental construir um propósito positivo que motive a mudança de comportamento.”

Mas além do emagrecimento, há também quem busque saúde e controle corporal por meio da atividade física — e nesse contexto, a linha entre dedicação e obsessão pode ser tênue. Como explica o psiquiatra e psicoterapeuta pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Eduardo Perin, a dedicação é saudável quando a corrida (ou qualquer outra atividade) está inserida como parte da vida e não como sua única prioridade. A obsessão começa a surgir quando o exercício traz sofrimento, culpa ou afeta negativamente outras áreas da vida, como o trabalho, os relacionamentos ou o bem-estar mental. Pensamentos como “se eu não correr hoje, tudo está perdido” são sinais de alerta.

Foto: Adobe Stock

Os principais gatilhos emocionais que levam ao reganho de peso

Ansiedade, estresse, tristeza, frustração e até a sensação de “eu mereço” algo após um dia difícil são gatilhos emocionais muito comuns. “Muitos pacientes dizem que sabiam o que deveriam fazer, mas acabavam comendo para aliviar emoções”, relata o médico.

Isso acontece porque alimentos ricos em açúcar e gordura ativam o sistema de recompensa do cérebro, liberando dopamina — o chamado “hormônio do prazer”. Além disso, estudos indicam que o estresse crônico afeta áreas cerebrais responsáveis pelo autocontrole, o que pode aumentar significativamente o risco de comer por impulso.

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Compulsão alimentar pode ser controlada apenas com força de vontade?

A resposta é: não. De acordo com o Dr. Renato, “A força de vontade sozinha não resolve um quadro de compulsão alimentar. Muitas vezes, é necessário o uso de medicação. A compulsão alimentar frequentemente está associada à ansiedade e à depressão.”

Trata-se de uma resposta complexa do cérebro, muitas vezes relacionada a traumas, desequilíbrios hormonais, privação de sono, altos níveis de estresse e padrões emocionais antigos. O tratamento deve ser multifatorial: pode incluir o uso de medicamentos, acompanhamento psicológico, mudanças no ambiente alimentar, melhora na relação com a comida e cuidado com o sono.

Esses fatores se relacionam também com a forma como nos dedicamos à atividade física. Como alerta Eduardo Perin, sinais como ansiedade e culpa por não ter treinado, insistência em treinar mesmo lesionado, ou negligenciar compromissos para manter a rotina de exercícios, podem indicar que algo que deveria ser prazeroso se transformou em sofrimento. Isso, inclusive, pode favorecer o desenvolvimento de transtornos alimentares, depressão ou ansiedade.

Criando uma relação saudável com a comida a longo prazo

O primeiro passo é ter clareza de propósito — ele orienta nossas escolhas no dia a dia. Em seguida, a prática da alimentação consciente se torna essencial. Essa abordagem ajuda a desconstruir a ideia de “comida boa” ou “comida ruim”, incentivando um olhar mais equilibrado sobre a alimentação.

A pessoa passa a identificar melhor os sinais reais de fome e saciedade, sem culpa e sem restrições radicais. Estudos mostram que a alimentação consciente contribui para a redução de episódios de compulsão e melhora o controle de peso de forma mais sustentável e prazerosa.

O risco da busca constante por superação
A superação pessoal é positiva, mas, segundo Perin, pode ser prejudicial quando se transforma em autocrítica exagerada ou insatisfação constante. “Todos devemos buscar ser melhores a cada dia, mas não a qualquer custo”, afirma o psiquiatra. Celebrar pequenas vitórias faz parte do processo de construção de uma vida saudável e equilibrada — mesmo que o progresso seja pequeno, ele ainda é um avanço.

As redes sociais distorcem a percepção de si mesmo
Outro ponto relevante é o impacto das comparações constantes nas redes sociais. “A comparação sempre será um ponto negativo, em qualquer área da vida”, alerta Perin. Treinos, corpos e rotinas muitas vezes irreais ou idealizadas nas redes podem minar a autoestima e provocar sentimentos de inadequação, ansiedade e até depressão. É importante lembrar que cada pessoa é única, com rotinas e corpos diferentes. A comparação distorce nossos pensamentos e nos afasta da construção de hábitos saudáveis e realistas.

Manter o peso não é apenas sobre controlar o corpo, mas principalmente sobre compreender a mente. A forma como nos alimentamos, nos exercitamos e lidamos com nossas emoções diz muito sobre como cuidamos de nós mesmos. Mudar hábitos exige paciência, compaixão e um compromisso diário com quem queremos nos tornar.

Elizama Modesto

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Jornalista por formação e apaixonada por contar boas histórias.