Você já ouviu falar sobre a utilização de cannabis medicinal? Conhece sobre o assunto? Sabe qual a relação entre ela e o esporte? Quando juntamos a pauta cannabis com o mundo do esporte, ela se torna ainda mais atrativa. É claro, que por ser recente, ainda há bastante dúvidas sobre o assunto e muitas pessoas ainda ficam com um pé atrás.
Por isso, para entender alguns pontos, conversamos com o médico Roberto Beck, otorrinolaringologista, Doutor em Ciências pela FMUSP e integrante do corpo clínico da Care Club, que explicou tudo o que você precisa saber sobre cannabis medicinal e esportes.
Foto: Adobe Stock
SISTEMA ENDOCANABINÓIDE
Para começar, é preciso entender como funciona o Sistema Endocanabinóide. Ele é um conjunto de moléculas e receptores e funciona como um painel de controle. Sua principal tarefa fisiológica é modular o equilíbrio do corpo.
Esse sistema regula vários aspectos, tendo influência em funções comportamentais, imunológicas, metabólicas e no controle da dor. Ele é ativado por canabinóides, sejam eles produzidos pelo nosso corpo (os endocanabinoides) ou presentes na planta Cannabis sativa L (os fitocanabinoides).
Acontece que nosso corpo produz compostos muito parecidos com os encontrados na planta. Exatamente por isso, que os produtos ricos em canabinóides apresentam tanto potencial terapêutico para o corpo humano.
Além disso, eles trazem outro benefício quando comparados com medicações sintéticas, como por exemplo, poucos efeitos colaterais, o que de acordo com Dr. Beck, ocorre devido a similaridade molecular que faz o organismo não identificar exatamente se é um corpo estranho ou se foi algo produzido por ele mesmo. Mas claro, tudo depende da dose.
No Brasil, desde 2019, a venda de produtos farmacêuticos derivados da cannabis é legalizada. Porém, esses produtos devem ser importados prontos ou apenas para finalização aqui, tendo em vista que o cultivo ainda não é legalizado. O fato de serem importados gera um aumento no valor do produto.
TIPOS DE PRODUTOS DE CANNABIS MEDICINAL
A planta cannabis produz mais de 100 tipos de canabinóides, todos com potencial terapêutico. Todo e qualquer produto de cannabis medicinal só é permitido com acompanhamento de um profissional habilitado. Apenas ele poderá indicar qual é o produto adequado para cada atleta.
Os produtos são variações entre concentrações destes compostos e estão divididos em três categorias:
Full Spectrum: produtos feitos a partir do extrato integral da planta. Os mais comuns são óleos com uma prevalência maior de CDB, contudo podem apresentar concentrações diversas de outros canabinoides como THC,CBN ou CBG.
Broad Spectrum: produtos que apresentam dois ou mais tipos de canabinoides da planta. Os mais comuns são óleos integrais da planta, mas sem presença de THC, responsável pelo efeito euforizante da cannabis.
Isolados: são extratos com apenas um composto canabinóide, com pureza próxima a 99%.
COMO OS PRODUTOS A BASE DE CANNABIS PODEM TRAZER BENEFÍCIOS AOS ATLETAS?
O esporte é uma prática que busca chegar aos limites do corpo humano, com isso, é normal que o corpo apresente inflamações, dores ou até mesmo sintomas como ansiedade, alterações de sono e apetite, além de lesões musculares. E é aí que a cannabis medicinal pode auxiliar no controle desses sintomas, trazendo benefícios como:
- Melhora na qualidade do sono.
- Melhora da recuperação muscular e neuromuscular.
- Diminuição da dor.
- Ansiolítico.
- Aumento da percepção de dor, consequentemente entendendo melhor seus limites.
- Benefícios para o sistema imunológico, fazendo com que o atleta não perca dias de treino.
Contudo, é importante frisar que todos esses benefíciosnão são imediatos e serão de forma indireta. “Hoje os derivados canabinoides para atletas não vai trazer benefício direto. Então, os benefícios, assim como todo o uso da cannabis, são indiretos, relacionados a melhora do equilíbrio e da qualidade de vida”, ressalta o médico.
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Quanto à performance, o aumento ou melhora não é comprovado por estudos. Mas, o especialista esclarece que um atleta com menos dor, menos inflamação, melhor sono e com uma qualidade de vida melhor, terá ganhos indiretos também em seu desempenho.
USO NA ROTINA DE TREINOS
Assim como qualquer outro medicamento, o uso de canabinóides também deve ser acompanhado por um profissional. O Dr. Roberto Beck explica que não existe uma “receita de bolo”, é necessário uma análise individual da necessidade de cada atleta.
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“O uso da cannabis na rotina dos treinos pode ser periodizado. Inclusive, como se faz com os treinos. A gente pode aumentar a dose à medida que aumenta o volume, e diminuir a dose à medida que diminui o volume. Perto das provas, pode-se fazer uma troca do fito canabinóide. Tudo isso é muito individualizado, não existe uma receita de bolo. Precisa ter um acompanhamento médico bem estreito”.
Outra dúvida bem comum entre os atletas é se existe ou não um óleo mais indicado para a prática de esporte? Em poucas palavras, depende da intenção. Visto que cada atleta tem um objetivo e um metabolismo que funciona de forma individual.
CONTRAINDICAÇÕES E DOPING
Não existe uma contraindicação específica para atletas se a pessoa já não possui alguma contraindicação ao uso de Cannabis, algo que deve ser conversado e analisado com um médico.
No entanto, ainda existe a preocupação com o doping. O THC ainda é considerado doping pela Agência Mundial Antidoping (WADA). A organização considera que o uso da substância vai “contra o espírito do esporte”.
Já o canabidiol (CBD), também derivado da Cannabis, não é considerado doping pela Wada. Portanto, atletas profissionais também podem utilizar.
Então:
CBD – não é doping
THC – é doping
A WADA permite uma concentração de 150 ng/mL de THC na urina.
Hoje, a desinformação, o preconceito e a falta de recursos para viabilizar pesquisas clínicas ainda são os principais entraves no Brasil para a utilização da cannabis medicinal, por isso, casos reais de pessoas que tiveram benefícios significativos a partir de seu uso são as melhores evidências para que a cannabis medicinal se popularize e que mais atletas possam conhecer seus benefícios.